Já estou no Brasil. e no avião, com mais de 9 horas de Panama City para São Paulo, decidi aproveitar o tempo e escrever algumas coisas que observei acompanhando essa turma.
O sucesso da Seleção Brasileira de Softbol Feminino Sub-16, Campeã do Mundo em Plant City, Flórida, USA. (uma opinião pessoal do Samurai Nervoso, que esteve lá)
Nada acontece por acaso. Principalmente um título mundial, inédito para o Brasil, diante de adversárias poderosas, temíveis.
Pouca gente faz idéia da dimensão dessa conquista. Seria o equivalente a uma seleção de futebol do Alaska ganhar uma copa do mundo enfrentando brasileiros, ou argentinos.
Parece exagero a comparação, mas não é. Existem mais de 1.000 times disputando campeonatos internos de softbol por todas as cidades dos Estados Unidos. Nós temos ao todo, talvez 300 jogadoras na idade sub-16, distribuidas em 10 a 15 times, que sofrem para se manter vivos, que juntam jogadoras de categorias menores para formar um time. E desse grupo reduzido, formamos a nossa Seleção Brasileira.
Até em Porto Rico, por exemplo, numa pequena cidade em que participamos de um torneio de Little League, havia mais de 30 campos, com pelo menos 10 campos com iluminação para jogos noturnos. No Brasil todo, nem no Bom Retiro existe iluminação.
Em Plant City, cidade com menos de 50 mil habitantes, o complexo da ISF, Federação Internacional de Softbol, 5 campos belíssimos, todos iluminados. Próximo dali, e próximo do hotel onde ficamos, mais 5 campos iluminados, abertos para a população jogar.
Equipamentos de treino em abundância, enquanto a Seleção Brasileira, não dispunha de tacos de qualidade. Através de Iniciativas individuais de alguns adultos que viajaram, foram comprados 3 tacos de qualidade para a competição. É o reflexo da cultura do esporte amador no Brasil, onde pais e atletas precisam superar toda e qualquer dificuldade de recursos, pois, aguardar que os órgãos oficiais resolvam isto, é só aumentar a frustração.
Esse resumido contexto visa dar uma melhor idéia do significado dessa conquista. O supervisor técnico de Porto Rico, tinha certeza de que ganharia do Brasil, pois estava com uma ótima seleção, com jogadoras pretendidas por Colégios Americanos. Seria uma revanche pois ele perdeu da equipe brasileira em Porto Rico, na Little League, com uma equipe que invicta havia 4 anos. Quando ganhamos deles na semi-final, ele veio, com muita humildade, reconhecer a excelência técnica e de atitude da nossa seleção. Tirou o chapéu. Porto Rico era considerada a favorita para o título.
Os bastidores que ninguém vê, mas, eu vi.
Sobre as jogadoras.
Fiquei impressionado, a cada dia que passava, com a concentração, o foco que todas mantinham em relação ao campeonato, jogo por jogo. Em todos esses dias durante os jogos, nenhuma, nenhuma delas vinha comentar em nosso quarto (que era a “lan house” para uso do Skype), que queria fazer compras, ir a shopping center etc. O assunto era sempre sobre jogadas, jogos, passados ou futuros. O máximo de “extravagância” que se permitiram, foi comprar salgadinhos e outras coisinhas na loja de conveniência do posto de gasolina perto do hotel.
Mesmo nos dias em que haveria jogo apenas à noite, com muitas horas de folga depois do treino, não cobravam da comissão saídas para compras. O meu quarto estava com várias coisas de beisebol e softbol compradas pela Internet no Brasil. Nem assim tocavam no assunto compras. Diziam que depois do campeonato iriam para Orlando e fariam as compras. Simplesmente admirável.
Mais, sobre as jogadoras.
Todas as 17 queriam jogar, evidentemente. Mas, mesmo sem ser escaladas para o jogo, não deixavam a alegria baixar, torciam muito pelas demais, e vibravam a cada strike, a cada eliminação. Essa atitude de desprendimento e humildade, davam bastante tranquilidade à comissão técnica, pois escalavam as jogadoras de acordo com as características do time adversário, sem precisar se preocupar com melindres, vaidades, estrelismos internos. Que grupo maduro!
E quando alguém do banco de reservas era chamada às pressas para entrar, como rebatedora, ou como corredora ou defensora, davam conta do recado com muita competência, com lindas batidas e defesas. Por isso, todas tinham condições de ser titular da seleção brasileira.
E sobre a Comissão Técnica.
Décadas atrás, acompanhei excelentes trabalhos de boas comissões técnicas, como CABA em Christal Lake.
Agora, nesta oportunidade com o Softbol, desde os treinamentos no Brasil, ficou claro que Fernando Fukuda, Roberto Fukunishi e Mikio Kanawa, e tendo a Guga como Manager, faziam um trabalho muito sério e com muita competência e dedicação extrema. Planejamento nos detalhes, orientações antes, durante e depois de cada treinamento. Demonstravam que tinham o grupo nas mãos. Idéias criativas e pessoais para arrecadar fundos também presenciamos, com botons, camisetas, bonés para vender.
Quando o Brasil perdeu uma partida, depois outra, depois outra, em nenhum momento se apontou culpados ou culpadas. Mantinham a cabeça no lugar, conscientes das regras do campeonato, e analisavam a trajetória para alcançar a final da Chave Internacional. Eu, por desconhecer o regulamento, estava mais preocupado, até o Roberto me tranquilizar e repassar tranquilidade para o pessoal do Brasil através do Blog.
Cada um contribuindo com seus pontos fortes, respeitando opiniões sem passar por cima das pessoas que podiam tomar a decisão final. Não tinham atitudes arrogantes. Faziam o que era necessário fazer para melhorar cada detalhe, de cada jogadora, em termos de defesa, de ataque, de posicionamento, de atitude etc. Guga repassando o máximo de sua experiência por ter jogado nos Estados Unidos, mostrava como a atitude em campo seria importante para não serem derrotadas psicologicamente pelas adversárias americanas.
Guga e Mikio sugeriram que eu desse uma palestra motivacional para as garotas nas vésperas da viagem. Fernando e Roberto prontamente concordaram. Foi nesse dia que a palavra CAUSA surgiu com muita força, dando origem ao blog Softbol Brasil Nossa Causa. Quando lutamos por uma CAUSA, que faz sentido para a vida, faz a nossa Coragem e Dedicação aumentar sem limites. E eram muitas as Causas que ficaram evidentes. As Causas seriam: os Senseis pelo trabalho e dedicação em todo o período de exaustivos treinamentos – as próprias Atletas, pelo empenho, dedicação, esforços, sacrifícios com viagens, estudos etc – os Pais e Patrocinadores, que também acompanham, têm gastos, preocupações, trabalham no suporte, na logística, viagens etc – O Softbol Brasileiro, que também precisa de um título importante, para revitalizar os horizontes desse esporte maravilhoso na formação de caráter e valores. – O Brasil, pois defenderemos o nosso país lá no exterior e queremos que o Brasil seja sempre bem visto e admirado pelo mundo. E todos viram a importância real dessas Causas, e iriam brigar por elas.
A Comissão de Logística.
Mesmo sendo um trabalho de equipe, onde todos contribuem para o resultado final, seria injusto não destacar pessoas pela diferença que fizeram. Seria injusto dizer que todos ajudaram, ou se entregaram igualmente.
Mary foi impressionante, desde os treinos no Brasil, até o final do campeonato e a conquista (e prosseguiu na viagem de lazer a Orlando, com certeza). Mesmo sendo mãe de uma das atletas, a Kim, dispensou igualmente, a todas as atletas e membros da comissão, toda a atenção possível e impossível. Foi incansável, dedicada, atenta, sensível, orientadora, decidida, apoiadora. Mesmo diante de situações de enlouquecer, pela correria e horários de jogos, horários de ônibus, limitações de recursos, mantinha a tranquilidade de um limpador de piscina. O carregamento de oniguiris (bolinhos de arroz) feitos ainda quente de queimar as mãos, sempre estavam prontos no horário. Nada jogava fora, reaproveitava tudo para a refeição seguinte. Conter as despesas era preocupação permanente de todos. Mary foi peça fundamental para manter o grupo todo em equilíbrio, sem stress, mesmo com a adrenalina lá em cima.
Em Plant City, Guga, que estava com o carro, funcionava de motorista, de compradora de alimentos, de intérprete, de energizadora. E Mary acompanhava e cuidava depois, com a Maryse, dos bolinhos de arroz, e outras delícias como hamburger grelhado na hora com um super George Foreman adquirido no Wal Mart em promoção. Paguei 40 dólares. Colocar roupas para lavar, pensar e preparar lanche, almoço, janta, tudo para economizar. Plano A, Plano B, pois tudo muda caso o time ganhe, caso o time perca. E astral sempre lá em cima, na cozinha improvisada no próprio refeitório do hotel, tendo que deixar tudo limpinho para não haver bronca do gerente, sendo que o gerente da madrugada era de um mau humor incrivel.
Mary, sempre a primeira a acordar, a última a dormir. E A Maryse sempre acompanhando o mesmo ritmo. Acredite se quiser: a Maryse ficou no mesmo quarto da Mary e Tchay, enquanto o maridão Fernando, o técnico da seleção, ficou no quarto com Roberto e Mikio. Só por aí dá para ver o grau de seriedade que esse pessoal encarou esta viagem e o Campeonato. Essa decisão do casal, não dá nenhum espaço para críticas ou comentários maldosos dos críticos de plantão, pois se considerava também a hipótese de o Brasil perder. Certamente as línguas venenosas iriam atacar o técnico por ter levado a esposa ao invés de se dedicar à Seleção. Maryse teve do Fernando, o mesmo tratamento que as demais mulheres tiveram durante todo o campeonato. Esse detalhe, eu faço questão de destacar.
A Mary FAZTUDO nunca pedia ajuda. Cada uma (Neuza, Tchay e Lolita) tinha que sacar por conta e fazer algo para ajudar. Maryse sempre junta, na cozinha, na limpeza e na torcida, virou titular do time de logística. Neuza e Lolita buscavam brechas para ajudar, procurando não atrapalhar. A Lolita era a chefe da grande torcida, com a Mary e Maryse. E a ajuda mais fácil era fazer as compras no outro carro alugado por Neuza e Raul.
A Tchay, se multiplicava para ajudar nas anotações, dar dicas para os técnicos sobre as jogadoras adversárias, assistir jogos dos prováveis adversários, anotar, relatar etc. E também ajudava o grupo da Mary.
Nenhuma briga, discussão, divergência, stress. Tudo era feito para tornar o ambiente o mais agradavel possivel, e as atletas bem alimentadas.
Raul e Paulo Tanaka ajudavam nas fotos e filmagens. Mais sacrificado era o Paulo, que tinha que filmar jogos dos adversários na mesma hora em que tinha o jogo da filha, a Lury. Paulo viou nosso relações públicas e desfilou com a bandeira do Brasil no encerramento. O Samurai Nervoso levou vantagem, pois ficou filmando e fotografando o Brasil para colocar no Blog.
O Blog Softbolbrasilnossacausa teve um inesperado sucesso. Em 10 dias teve mais de 12 mil acessos! Nos últimos dias, mais de 2.000 acessos. E as jogadoras ficavam ansiosas para ver os comentários que vinham do Brasil, todos de incentivo. Isso ajudava a manter o alto astral das nossas meninas. Os campeões dos comentários no blog foram o pai da Alexandra e da Kim, e a mãe da Naty.
Só agorareparei que, fazendo este flash-back, e apenas a título de observação, não de sugestão nem de crítica, na Delegação Brasileira não havia nenhum cartola da CBBS. Se estivesse presente, certamente teria que dedicar atenção aos cartolas da ISF entre almoços e jantares, e exigiria horas dos nossos técnicos e da Guga para cumprirem as funções sociais e de relações públicas, desviando um pouco do foco do grupo. Isso permitiu que o trajeto era sempre o mesmo: hotel, campo, hotel, campo, em todos os 7 dias de jogos, para um total de 10 ou 11 jogos para o Brasil ser campeão.
Os adultos que não faziam parte da delegação oficial, como a Maryse, Paulo Tanaka, Lolita, Raul e Neuza, tinham que ter sempre o “simancol” para sentir quando deveriam estar juntos ou mais afastados das meninas. Isso foi respeitado. A chegada da Veronika, filha do Roberto Fukunishi, ajudou bastante o trabalho da Guga e também da comissão técnica. Também sabia quando se aproximar, quando estar interagindo forte, e quando se manter mais distante. Muito madura e apoiadora a Verônika nos dias em que passou com a gente, tendo que ir para a Universidade antes dos dois jogos finais. Enfim, todos que foram a Plant City ajudaram e ninguém deu “nota fora”.
Em Resumo.
O título inédito e grandioso desta Seleção Brasileira, foi apenas consequência de um conjunto de fatores, pessoas, atitudes e decisões.
As pessoas certas, nas funções e momentos certos. Fernando Fukuda, Roberto Fukunishi e Dirceu Mikio Kanawa, Guga, Mary e Tchay.
O ambiente de absoluta confiança e apoio mútuo.
As atletas corresponderam totalmente às expectativas que todos tínhamos sobre cada uma delas, dentro e fora do campo. Mostraram lá fora, o que sabem fazer, e foram muito aplaudidas por todos.
Esforços pessoais no Brasil, como do Tommy, Silvio, Sakamoto, João, Eduardo, Milton, Higashi.
O apoio e torcida recebida do Brasil.
E agora, é só comemorar, passear na Disney, shoppear etc.